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segunda-feira, 22 de setembro de 2014

O livro dos Atos

O livro dos Atos foi escrito nos anos 80-90 e reflete o seguinte quadro:
a) A maioria dos apóstolos já estava morta.

b) Muitos pagãos aderiram à fé provocando crise de identidade.

c) O cristianismo começa a se distanciar do judaísmo.

d) Os judeus perseguem os cristãos, tachando-os de hereges e traidores. Os romanos os perseguem, vendo-os como subversivos. (revolucionários)

e) Alguns se perguntam: as comunidades cristãs são ainda a continuação do antigo povo escolhido (AT)? Outros questionam: as comunidades continuam a caminhada de Jesus?

O autor quer provar a fidelidade das comunidades a Jesus e ao AT, bem como contornar os problemas com judeus e romanos. O autor não é historiador, mas teólogo. Desta forma pinta um Paulo bem mais adocicado do que o real que se conhece pelas cartas. O autor quer legitimar a missão paulina, para isto apela a Pedro. Até o Pedro dos Atos é Paulino (prega aos gentios - comparar Atos 10 com Gl 2,7-10. Ele vincula suas comunidades paulinas com a comunidade de Jerusalém.

O autor do livro de Atos tem intenção específica; (não é livro histórico) é um livro de uma releitura da história. Escreveu a partir de seu ponto de vista. NÃO É UM RELATÓRIO. O que está se fazendo invisível? No que o autor quer que acreditemos? Não podemos nos deixar manipular pelas intenções do autor.

O livro de Atos dos Apóstolos
Como surgiu? Quem o escreveu? Para quem?

A bíblia não “apareceu”, mas foi constituída a partir de uma vivência dentro de uma História. Grupos de pessoas escreveram com intenção própria, com metas específicas. Elas nos passam suas experiências de vida dentro de sua história.

Para escrever Atos, seu autor fez uso da língua grega, esforçando-se para escrever bem, com qualidade (seu grego é dos melhores do Novo testamento). No seu estilo de narrar, o autor de Atos apresenta um vai e vem de episódios, uma historia dentro da outra, que dão muito dinamismo e dramaticidade ao texto. Assim, por exemplo, a primeira narrativa da conversão de Paulo está em Atos 9,1-14; mas Paulo já aparece na cena do martírio de Estevão em Atos 7,58 e 8,1.3.

Não podemos dizer com certeza que o autor de Atos tivesse sido companheiro de Paulo. Mas podemos afirmar com garantia total que o autor de Atos dos Apóstolos foi o mesmo que escreveu o terceiro evangelho: (Lucas, ou a mesma comunidade). A partir de agora diremos ter sido Lucas.
O autor não deu título à sua obra, apenas lhe dá um destinatário (At 1,1-2; Lc 1,1-4): Teófilo. Isto é comum na literatura grega da época, portanto, o destinatário são comunidades, não uma pessoa. O autor não assina, Desde o séc. II ele é atribuído a Lucas. Era comum atribuir livros a pessoas importantes.

Quem é Lucas?
Colossensses 4,14 = “Saúda-vos Lucas, o caríssimo médico, e Demas”.
Atos 16, 10-17 = era companheiro de Paulo em suas missões.

Lucas escreve após a destruição do templo (ano 70 d.C.). Escreve para comunidades paulinas uns 10 ou 20 anos após a morte de Paulo. Sua mensagem é que Jesus é o LIBERTADOR.. Escreve numa comunidade que depois de uns 30 anos da morte de Jesus, vive a sua realidade. Lucas sente que a comunidade está fria e não vive a realidade JESUS. Tenta reanima-la com seus escritos.
O lugar de onde Lucas escreve, não está especificado. Sabemos que foi dentro do Império Romano.

O título não faz jus ao conteúdo, pois não conta os atos dos apóstolos, mas somente os de Pedro e os de Paulo. Deveria se chamar corretamente de Atos de Paulo, pois tudo gira em volta dele. O que vem antes prepara o caminho de Paulo.

Três linhas dentro de Atos:

• Aspecto histórico – muitos conflitos. Lucas quer mostrar a continuidade de uma comunidade.

• A espiritualidade é a mesma que o povo de Israel tinha. É uma continuidade.

• Continuidade do mesmo Cristo do antigo Testamento. É o mesmo motivo que animou outras comunidades anteriores. São raízes comuns, espiritualidade comum.

Chaves de leitura
1- Ler a partir do Espírito Santo.
2- Ler a partir da Perspectiva da MISSÃO (até os confins da terra).
3- Ler a partir das pequenas comunidades – a casa – o templo era da comunidade judaica.
4- Ler a partir da inter-culturalidade.
5- A partir das mulheres.
6- Dimensão sócio-político

Os principais problemas que ele enfrenta, são:

a) O desafio da comunidade de mesa

Nas comunidades cristãs conviviam cristãos-judeus e não-judeus (Prosélitos e tementes a Deus). Os judeus não podem aceitar que pagãos sentem com eles à mesa para a refeição ou eucaristia (At 11,1ss; 15,19ss). Até Pedro é vítima deste preconceito (At 10,16-18.28; Gl 2,11-14). Lc, para resolver este problema que diminuía os pagãos, vendo ameaçado seu espírito missionário, mostra que Paulo comia com os pagãos: Lídia (16,14-15), carcereiro (16,34), Justo (18,6b), no navio (27,33-38). Até Pedro já comia com eles (10,16ss; 11,1ss). No entanto, At 10,16ss; 11,1ss e 15,7ss não combinam bem com Gl 2,1-14. Se Paulo é acusado de ter introduzido pagãos no templo (21,29), Lc o defende dizendo que isto já Pedro e Tiago o permitiram antes dele (At 10;11;15,20.29). Lc faz com que a prática de Paulo seja legitimada por Pedro e Tiago.
Os At se referem muito aos prosélitos e adoradores de Deus (ver Bíblia de Jerusalém, nota a At 2,11). Estes se sentiam excluídos do templo e do convívio com os judeus.
Agora, no cristianismo, se verificava o mesmo. Lc que também é prosélito quer resolver este problema, obstáculo da evangelização.


b) Judeus se distanciando de Israel
Os cristãos vindos do judaísmo se sentem expulsos das sinagogas. Não conseguem conciliar judaísmo e cristianismo.
Depois da tragédia de 70 os judeus (fariseus) se reorganizam em Jâmnia, uma cidadezinha a 50 quilômetros de Jerusalém. O centro da vida religiosa será, de agora em diante, não mais o templo nem as funções sacerdotais, mas a Tora escrita e sua interpretação oral. Acentua-se desta forma a ortodoxia e os Judeus pressionam os cristãos a voltarem ou seriam traidores. Lucas quer encorajar estes cristãos judeus. Os traidores do AT são os chefes de Israel, os doutores e sacerdotes e não Jesus e seus seguidores.
Ele pinta negativamente os líderes judeus. Neste tempo a igreja está em fase de transição. Já não é bem judaísmo, mas também ainda não tem estrutura de igreja. Quase só se fala da fundação das igrejas, mas nunca de sua estrutura.
Tem resquício de Israel (Os Doze), mas já tem estrutura helênica (Os sete At 6, e os cinco At 13).

c) Os gregos e sua fidelidade ao Império
Muitos funcionários do Império aderiram à fé. Será possível ser fiel a Jesus e ao Império? Como aderir a Jesus e ter Paulo por missionário importante se os dois foram eliminados pelo Império? Lucas é muito simpático ao Império Romano.
Assim ele sempre empurra a culpa pela morte de Jesus e de Paulo aos chefes dos judeus, enquanto os romanos são bonzinhos (Lc 23,22; At 3,13), o centurião romano reconhece que Jesus é justo (Lc 23,47), os chefes romanos protegem a Paulo (13,13; 16,30-34; 18,16). Paulo é perseguido pelos judeus e salvo pelos romanos (21,27ss; 23,10ss; 24,25; 26,31s). Os culpados sempre são os judeus. Lc nem sequer menciona o martírio de Pedro e Paulo em Roma, pois quer atrair as benesses do Império.

d) Convivência de ricos e pobres
Nas comunidades lucanas convivem ricos e pobres. No mundo grego isto era inimaginável. Havia os bem ricos e os quase mendigos (+ de 50% são escravos). Lc mostra a convivência
(2,42ss; 4,32ss e 5,12ss), insiste em acabar com a escravidão ao dinheiro (Lc 3,13s; 12,33; 14,14). Em At o dinheiro é visto de forma negativa (Judas 1,18; Ananias e Safira 5,1-11; Simão, o mago 8,20; Os amos da moça possuída 16,19; o lucro dos ourives 19,24). Os apóstolos não têm dinheiro (3,5), Paulo não quer prata (20,33). Lc tem mensagem concreta para os pobres: Magnificat (Lc 1,46-55), Discurso inaugural em Nazaré (Lc 4,18) e na parábola do banquete (Lc 14,12-24). At realiza este programa do Magnificat e do discurso de Nazaré nas comunidades de Jerusalém. Não há necessitados entre eles.

Conclusão
Em meio a todos estes problemas, Lc quer mostrar que a Palavra de Jesus, movida pelo Espírito Santo, avança. O número de fiéis aumenta (2,41.47; 6,7, etc. Se o evangelho de Lc é o livro de Jesus, o dos At é o livro do Espírito Santo.
O Espírito produz a Palavra (2,4.17; 4,31; 19,6). Existem muitos obstáculos, mas a Palavra vence.

2.2 - Período de transição
At reflete um período em que a Igreja ainda não é bem definida, mas já se distingue do judaísmo. Ela quer ser o verdadeiro Israel, não se pensa como separação do judaísmo, mas pensa que o judaísmo se separou da antiga tradição. Não tem ainda estrutura formada, tudo é muito carismático. O livro fala muito da fundação das comunidades, mas pouco de sua estrutura. O fato de colocar a base da Igreja em Jerusalém (At 1-5) mostra que o cordão umbilical da Igreja não está totalmente cortado.
 "A obra de Lucas aparece como representando uma fase de transição entre dois estados sociológicos. O ponto de partida é um cristianismo que constitui apenas um movimento religioso dentro do judaísmo, não muito diferente do partido dos fariseus, dos essênios, dos zelotes, dos saduceus."
2.3 - O projeto de Lucas
Lucas quer animar comunidades paulinas dos anos 80-90 onde o evangelho foi anunciado a judeus e a pagãos (tarefa de Paulo). Os judeus olham com desprezo para Paulo (morto há
uns 20 anos) por ter misturado tudo. Lc quer justificar Paulo, por isto ele olha para trás e escreve os At. Ou melhor, Lc escreve os atos de Paulo (At 13-28) justificando os pelo Espírito Santo. Paulo anunciou o evangelho aos pagãos movido pelo Espírito Santo. Para justificar melhor a atitude de Paulo, ele escreve os capítulos 1-12 como preparação à missão de Paulo. Assim, em 1-5 temos a comunidade referência, de Jerusalém (comunidade ideal que mais reflete os desejos das comunidades lucanas dos anos 80 do que as comunidades de Jerusalém), temos em 6-8 um novo modelo de igreja emergente (helenista) e a partir de então Pedro é o preparador do caminho de Paulo. Pedro vai aos pagãos (10).
Os apóstolos legitimam a missão (15). Isto na prática não foi bem assim.

Lucas não conheceu bem a Palestina, o judaísmo nem a teologia de Paulo. Muito do que diz sobre Paulo não concorda com o Paulo das cartas. Pinta um Paulo bastante adocicado, bem diferente do auto-retrato que Paulo faz nas epístolas. Conhece a LXX. Conhece bem o mundo grego e romano. Despreza a religião popular grega como magia e idolatria.
Fala muito de prosélitos (2,11; 6,5; 13,43 etc. Alguns têm destaque: Nicolau (6,5), Cornélio (10), Lídia (16,14), Justo (18,7). Cita também muitas mulheres que têm papel importante (1,14; 2,17; 12,12; 21,9).
Lucas reflete missionários carismáticos ambulantes (At 13,1-5) que andam de cidade em cidade anunciando o evangelho, igualmente a Paulo. Tempo em que ainda não se tem muitos líderes locais.


2.4 - Estrutura literária.

• Introdução 1,1-11

• I - Jerusalém, comunidade de referência 1,12-7,60
- Os Doze (judaica) 1,12-5,42
- Os Sete (helenista) 6,1-7,60

• II - Rumo a Antioquia, abertura aos pagãos 8,1-15,35
- De Jerusalém a Antioquia 8,1- 12,25
- Antioquia inaugura a missão 13,1-15,35

• III - A grande Missão de Paulo 15,36-19,20

• IV - O Processo de Paulo 19,21-28,31
- Viagem para Jerusalém 19,21-21-14
- Jerusalém 21,15-26,32
- Roma 27,1-28,31

Não é livro histórico, mas nos Atos temos algumas informações Históricas, sociológicas, antropológicas e religiosas.

A ênfase é a missão fora de Jerusalém (da nova Igreja). (grandes figuras; Paulo, Pedro, Silas, mas de outras pessoas menores (figurinhas) que são de muita importância. Estes pequenos nos dão chaves importantes.

PONTOS CHAVES

Atos 1,1-11 nos apresentam:
• Conexão com o Evangelho
• Dedicação (Teófilo)
• Ascensão + Ressurreição = manifestação Histórica
• Presença do Espírito Santo.

1, 12 = Reunião dos discípulos
1, 15 = Eleição de Matias.

O prólogo 1,1-11

At 1,1-11 repete Lc 24,13-53 em perspectiva diferente:
Lc 24 é coroamento At 1 é abertura, portanto, há diferenças, já que não é história. Inicia-se nova fase da missão, a fase do Espírito Santo. No início da missão de Jesus está o batismo de João, no início da missão dos apóstolos está o batismo do Espírito, pois ele é, doravante o movedor da missão. A missão parte de Jerusalém (Mt 28,16ss e Mc 16,7 relatam estes acontecimentos na Galiléia). Com isto Lc quer ligar a missão de suas comunidades (anos 80) com Jesus e com o AT. Lc sempre parte de Jerusalém (apresentação do menino no templo: Lc 2,22sss; o menino entre os doutores: Lc 2,41ss; a tentação é em Jerusalém: Lc 4,9). Isto tudo indica que Jesus continua o Antigo Testamento. Também a missão dos apóstolos, movida pelo Espírito Santo, parte de Jerusalém, pois continua Jesus e o AT. De lá vai para os confins. Pode-se dizer, Lc 1-2 coloca Jesus em continuidade com Israel.
At 1,1-11 coloca as comunidades em continuação com Jesus.

Síntese:
A ascensão não é fato histórico na maneira atual de entender. É testemunho de que Jesus está vivo, que sua obra continua nos apóstolos movidos pelo Espírito Santo. Os cristãos das comunidades lucanas se espelham neste relato:
Vêem Jesus vivo, mas não podem esperar dele uma ação mágica de instauração do Reino, nem devem imaginar que agora está tudo perdido, pois Jesus já não está fisicamente presente. Tudo o que se esperava desde o AT se realiza em Jesus, mas agora são os cristãos, movidos pelo ES que farão o que Jesus fazia. A realeza (v.6-8) não cairá do céu, mas os discípulos, movidos pelo ES o anunciarão até os confins da terra. A ascensão é um marco, um relato, um mito que quer mostrar que Jesus é muito mais que um homem comum.

No Atos mostra que não temos Jesus, mas temos o Espírito Santo, o enviado. Lucas é o que mais fala do Espírito Santo (51) vezes.

Os v.6-8 são como o programa de todo livro dos At. A missão sai de Jerusalém e se expande até os confins do mundo.
Os v.9-11 representam o espaço de ação dos discípulos, isto é, entre a subida e a volta de Jesus.

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